Samuel é uma das figuras mais influentes do Antigo Testamento. Último dos juízes, primeiro grande profeta após Moisés e ungidor de reis, ele foi o elo entre a época tribal e a monarquia israelita. Neste artigo explicativo, detalhamos sua trajetória — desde o clamor de sua mãe estéril até seu impacto pós‑morte — em linguagem acessível, porém rica em contexto histórico e teológico.
1. Contexto histórico: Israel antes da monarquia
Após a morte de Josué, Israel entrou no chamado “período dos juízes” (Jz 2:16‑19). As tribos viviam dispersas, a liderança era episódica e a fé em YHWH alternava com idolatria cananeia. O caos social e espiritual preparou o palco para o surgimento de Samuel como reformador nacional.
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Ver Produto2. O voto de Ana e o nascimento milagroso de Samuel
A história começa em Ramá (1 Sm 1). Ana, esposa de Elcana, era estéril — um estigma cultural intenso. Em Shiló, onde o tabernáculo estava instalado, ela fez voto: se Deus lhe desse um filho, ele seria dedicado ao serviço divino por toda a vida, como nazireu (sem cortar cabelo). Deus atendeu, e o menino recebeu o nome Šĕmû’ēl (“pedido a Deus” ou “Deus ouve”).
3. Primeiros anos no tabernáculo sob o sacerdote Eli
Desmamado, Samuel foi entregue ao sumo sacerdote Eli em Silo. Lá, apesar da corrupção dos filhos de Eli (Hofni e Fineias), o jovem demonstrou dedicação, vestindo “efod de linho” e crescendo “em graça diante do Senhor” (1 Sm 2:26). Esse contraste sublinhou seu futuro papel de renovador.
4. O chamado divino durante a infância
Em uma noite decisiva, Samuel ouviu seu nome ser chamado três vezes. Pensando ser Eli, correu ao sacerdote. Na quarta chamada, orientado por Eli, respondeu: “Fala, Senhor, porque teu servo ouve” (1 Sm 3:10). Deus então revelou juízo sobre a casa de Eli e confirmou Samuel como profeta confiável em todo Israel.
5. A Arca capturada e a transição de liderança
Os filisteus derrotaram Israel em Afeca; Hofni, Fineias e 30 000 soldados morreram, e a Arca foi capturada (1 Sm 4). Eli morreu ao ouvir a notícia. Esse desastre nacional abriu caminho para Samuel exercer liderança plena como juiz e profeta, conduzindo o povo ao arrependimento e restaurando a adoração exclusiva a YHWH.
6. Samuel como último juiz: reforma e vitória em Ebenézer
Convocando assembleia em Mispá, Samuel exortou: “Lançai fora os deuses estranhos” (1 Sm 7:3). O arrependimento coletivo foi seguido por ataque filisteu, mas um trovão divino trouxe vitória israelita. Samuel erigiu pedra memorial chamada Ebenézer (“pedra de ajuda”), cimentando sua reputação de líder espiritual e militar.
7. O pedido por um rei e a unção de Saul
Na velhice de Samuel, seus filhos Joel e Abias foram juízes corruptos. As tribos então exigiram um rei “como as outras nações” (1 Sm 8:5). Samuel, relutante, consultou Deus; YHWH instruiu‑o a atender, advertindo sobre os custos da monarquia. Guiado por revelação, Samuel ungiu Saul de Benjamim, sinalizando a transição político‑teológica de Israel.
8. Saul coroado e as primeiras vitórias
Em Gilgal, Samuel ratificou Saul como rei, exortando‑o à obediência. Saul liderou libertação de Jabes‑Gileade e consolidou apoio tribal. Samuel, no “discurso de despedida” (1 Sm 12), lembrou a fidelidade divina e alertou: rei e povo prosperariam somente obedecendo a YHWH.
9. A desobediência de Saul e o anúncio de rejeição
Dois atos marcaram a ruptura: (a) sacrifício precipitado em Gilgal sem esperar Samuel (1 Sm 13) e (b) desobediência parcial contra os amalequitas, poupando rei Agague e despojos (1 Sm 15). Samuel pronunciou a sentença: “A obediência é melhor que o sacrifício… O Senhor rejeitou‑te” — palavras que ecoam até hoje em ética religiosa.
10. A unção de Davi e o declínio de Saul
Conduzido secretamente a Belém, Samuel ungiu Davi, o menor dos filhos de Jessé (1 Sm 16). O Espírito do Senhor se apoderou de Davi, enquanto um “espírito mau” atormentava Saul. Samuel, entretanto, retirou‑se para Ramá e limitou aparições públicas, mas continuou intercessor da nação.
11. Ministério profético maduro e escolas de profetas
Tradicionalmente, Samuel é visto como fundador das “escolas de profetas” (1 Sm 19:20). Esses centros fomentavam louvor, instrução e transmissão da Torá, preparando a próxima geração para orientar reis e povo — um sistema que evolui nos profetas posteriores (Elias, Eliseu, etc.).
12. Morte de Samuel e impacto nacional
Samuel morreu em Ramá; “todo Israel se ajuntou e o pranteou” (1 Sm 25:1). Mesmo após a morte, sua autoridade era reconhecida: Saul buscou necromante em En‑Dor e teve aparição de Samuel, que reiterou a sentença de juízo (1 Sm 28). O relato reforça sua condição de porta‑voz definitivo da vontade divina.
13. Legado teológico e histórico de Samuel
Samuel representa: (1) fidelidade pessoal desde a infância, (2) liderança reformadora em tempos de corrupção, (3) transição de era tribal para monárquica, (4) ênfase na obediência sobre rituais externos. Seu nome resume a verdade central: Deus ouve e fala.
FAQ – Perguntas frequentes sobre Samuel
- Samuel era levita? Sim. Elcana era efraimita por território, mas genealogicamente da linhagem levítica de Coate (1 Cr 6:33‑38).
- Quantos anos Samuel viveu? A Bíblia não especifica, mas indícios sugerem que superou 80 anos, pois julgou Israel “todos os dias de sua vida” (1 Sm 7:15) e viu Saul e Davi jovens.
- Samuel escreveu algum livro bíblico? A tradição judaica atribui‑lhe parte de Juízes, Rute e 1 Samuel até o capítulo 24; contudo, a autoria final é composta.
- Por que Samuel foi contra a monarquia? Temia que o rei usurpasse o senhorio divino e explorasse o povo; ainda assim, obedeceu à direção de Deus.
- O que significa Ebenézer? “Pedra de ajuda”. Marca a vitória sobre os filisteus e a declaração “Até aqui nos ajudou o Senhor” (1 Sm 7:12).
Conclusão
De filho prometido a juiz reformador, de profeta a conselheiro de reis, Samuel moldou o destino de Israel em uma encruzilhada histórica. Sua vida demonstra que liderança espiritual autêntica nasce de intimidade com Deus, coragem moral e disposição para confrontar a desobediência — seja nos altares de Silo, nos campos de batalha contra filisteus ou no trono de um rei relutante. A história de Samuel continua inspirando fé, perseverança e compromisso com a verdade em qualquer geração.